segunda-feira, 9 de novembro de 2009

A Capoeira e o Muro Chapiscado


Ontem assisti uma matéria no GNT sobre o novo filme brasileiro "Besouro".
O filme foi baseado no livro Feijoada no Paraíso de Marco Carvalho e conta a história do capoeirista baiano chamado Besouro, que era protegido pelos orixás e que tinha o dom de voar.

Hoje em uma reunião na agência, comentei que queria assistir o filme para aprender alguns golpes e durante minha fala, lembrei do meu passado de pouca glória no mundo da capoeira. Na verdade, pouca glória e pouco tempo. Não passou de três dias.

Imbuída do desejo pelo exercício perfeito, percebi várias amigas praticando a arte da capoeira. Todas estavam gostando muito do exercício puxado. Elogiavam o ritmo da aula e se gabavam de seus apelidos recebidos pelos respectivos mestres na hora do batismo.

Resolvi praticar esta arte. Sempre gostei de capoeira, adoro as músicas e as histórias que contavam... Sempre que havia alguma roda eu ia assistir, ainda mais depois que tantos amigos começaram a participar.

Fui super bem recebida pelo meu mestre Lacraia. Ele me falou sobre o ritmo da aula e que era para eu ser persistente, pois muitos desistiam nos primeiros dias. Aceitei o desafio pensando na frase: "Desistir é para os fracos!"

Primeira aula foi cruel. Muito exercício físico até chegar nos quinze minutos de roda que era o que eu queria. Me peguei várias vezes usando a frase dos fracos para me animar. Eu a repetia como mantra durante a corrida de 30 minutos, durante as 114 séries de um exercício que nos fazia pular e nos jogar no chão e nas flexões de braço com quantidade eterna. Quando eu estava quase desistindo das 4 séries de 800 abdominais que meu mestre havia solicitado, comecei a fraquejar. Não queria ser fraca. Fui para casa mentalizando o sucesso do dia seguinte. Afinal era apenas a primeira aula.

Não sei porque, mas eu queria muito o nome de batismo. Só o conseguiria se enfrentasse o sedentarismo ali. Era minha chance!

Segundo dia cheguei lá parecendo um Playmobil. Bracinhos e perninhas duras. minhas lamentações arrancaram gargalhadas e palavras de incentivo do meu querido mestre. Sentindo-me aparada, fui para a segunda aula. Foi mais difícil que a anterior. Bom, era apenas a segunda aula e o mantra ainda faria efeito em algum momento.

Terceira aula. O ácido lático era mais presente em meu corpo do que o maldito mantra que eu repetia mentalmente, já fazendo modificações na frase inicial: "Desistir dos desafios pesados é prudência!"
Ao terminar a aula, eu estava um Playmobil desgovernado. Eu não coordenava meus movimentos. A vibe era boneco de Olinda bêbado e ensandecido com tendência a tentativas de suicídio. As tentativas de suicídios eram pequenos atos que pensei conseguir fazer e que sem controle do meu próprio corpo eu não conseguia realizar, tornando-se perigosos. Descer a escada com três degraus, atravessar a rua e andar em linha reta são alguns exemplos.
Ao sair do galpão, quase caí do segundo degrau por não conseguir dobrar a perna que tremia com fervor.

Tentei seguir em linha reta. O objetivo era chegar a um ponto de ônibus. Ainda bem que eu tinha as paredes como aliadas, pois eu andava arrastando meu tronco por elas para ganhar sustentação. O problema foi no momento que surgiu um muro chapiscado (aquele que os pedreiros lançam cimento através de peneiras formando espinhos agressivos). Eu não consegui desviar. Não tinha forças. Mentalmente pensei em focar todo o resto das minhas forças em uma tentativa de jogar meu corpo para o lado contrário (que era o da rua). Avaliei e constatei que poderia ser fatal. Eu realmente não estava conseguindo coordenar movimento algum. Insisti na linha reta e no muro chapiscado. Naquela altura da aventura, alguns arranhados no braço esquerdo e um pouco de sangue não eram nada perto da dor que eu sentia por todo o corpo.


Com muita sorte e auxílio do meu anjo da guarda, consegui me deslocar 2 quadras. Ao passar na frente do prédio de uma amiga, fui reconhecida pelo porteiro. Alah!!! Sempre que passava por ali eu o cumprimentava feliz e conversava com ele se possível. Como não o fiz, ele percebeu algo estranho e foi ao meu encontro. Riu um pouquinho ao me amparar e me conduzir até o interior da portaria enquanto eu contava minha saga. Me deu água e me ajudou a ligar para minha mãe. Me orientou pedir auxílio a ela. Melhor do que demorar 114 dias até conseguir subir em um ônibus.

Dias depois fui no galpão me despedir do mestre. Apesar do fracasso, consegui que ele me desse um nome, mesmo sem batismo. Branca.

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